A hemofilia é uma doença hereditária incurável caracterizada por sangramentos espontâneos (internos e externos), retardo no tempo de coagulação sanguínea, hematomas, dores e inchaço nas articulações. É causada pela insuficiência de fatores coagulantes no sangue e, quando não tratada, pode levar à morte por hemorragia.
Quando há a ruptura em algum vaso sanguíneo, o sangue passa a fluir para fora. Isso pode ocorrer tanto dentro do corpo, caracterizando sangramentos internos, quanto fora, como quando alguém sofre um corte. No local da ruptura, proteínas chamadas fatores coagulantes trabalham juntamente com as plaquetas sanguíneas para formar uma espécie de tampão e estancar o sangramento. A esse tampão dá-se o nome de coágulo sanguíneo.
A pessoa hemofílica tem problemas na produção dos fatores coagulantes e, por isso, o processo é dificultado e se torna mais lento. Assim, ao sofrer alguma lesão, o hemofílico pode vir a sangrar por mais tempo do que uma pessoa com a coagulação normal. Além disso, a doença está também associada a frequentes sangramentos espontâneos nos músculos e órgãos, causando hemorragias internas difíceis de parar.
Dependendo da gravidade, o distúrbio é identificado logo nos primeiros anos de vida da criança, através de manchas na pele (hematomas) assim que ela começa a engatinhar ou andar. Em outros casos, adolescentes e adultos podem descobrir que sofrem de hemofilia após cirurgias, extrações dentárias ou acidentes graves, por terem um grau moderado ou leve da doença que não se manifesta com sangramentos internos.
Um dos casos mais famosos de hemofilia na história é o da Rainha Vitória, do Reino Unido, que era portadora e passou o gene para seus descendentes. Acredita-se que a condição da rainha foi causada por uma mutação genética espontânea, que resultou no aparecimento da hemofilia na família real inglesa e, posteriormente, em diversas realezas.
Por estar diretamente ligada ao cromossomo sexual X, a hemofilia é mais frequente em homens, mas também pode ocorrer em mulheres caso a mesma tenha alterações nos dois cromossomos sexuais.
Muitas pessoas se perguntam se há uma relação entre a hemofilia, doença da coagulação do sangue, e o daltonismo, doença que altera a percepção das cores. Isso acontece porque ambas estão diretamente ligadas ao cromossomo X e se manifestam, na maioria dos casos, em homens.
Entretanto, a semelhança para por aí. Não há estudos que comprovem qualquer outro tipo de relação entre essas duas condições.
A hemofilia pode ser classificada de acordo com o fator de coagulação faltante ou, ainda, de acordo com a sua gravidade. Saiba mais sobre os tipos de hemofilia abaixo:
É a forma mais comum da hemofilia, causada por alterações no gene F8, que altera a produção do fator VIII. Afeta cerca de 1 a cada 5.000 nascimentos do sexo masculino.
Causada por alterações no gene F9, esse tipo de hemofilia afeta o fator IX e ocorre em cerca de 1 a cada 34.000 nascimentos do sexo masculino.
Extremamente rara, a hemofilia C tem sintomas mais suaves e afeta o fator XI e tem incidência igual em homens e mulheres, pois a alteração não está nos cromossomos sexuais. É mais comum em pessoas descendentes dos judeus asquenazes, porém é encontrada também em outras etnias.
Em algumas pessoas, o sistema imunológico pode se confundir e atacar as próprias células saudáveis do corpo humano, causando as chamadas doenças autoimunes. Quando o organismo cria anticorpos contra os fatores coagulantes, desenvolve-se uma hemofilia adquirida, que pode afetar pessoas de todos os sexos, idades e etnias. Vale ressaltar que esse é o tipo mais raro da doença.
Como as alterações genéticas nem sempre cessam completamente a produção das proteínas, a gravidade da doença depende da quantidade do fator coagulante no sangue. Entenda melhor:
Embora a hemofilia seja uma doença tipicamente genética, ela pode ser causada também por outros fatores. Ainda que mais raramente, a condição pode se desenvolver por fatores autoimunes, que não é transmissível geneticamente, ou por mutação espontânea, que pode ser passada para os filhos.
Entenda melhor as causas:
Os tipos A e B da hemofilia estão ligados a um gene presente no cromossomo sexual X. Por isso, a doença é mais comum em homens, que possuem apenas 1 cromossomo X, enquanto as mulheres possuem 2 e, quando um deles está com algum defeito, o outro pode compensar.
A informação de como produzir o fator coagulante está codificada no cromossomo sexual X. Quando há alguma alteração no gene responsável pela proteína, o organismo pode passar a produzir uma proteína defeituosa ou até mesmo cancelar sua produção. Essa deformidade na proteína causa complicações no processo de coagulação, uma vez que cada fator é imprescindível para a realização do coágulo.
Em geral, as mulheres que possuem um gene defeituoso não apresentam sintomas da doença e são chamadas de “portadoras”. Quando essa mulher tem um filho, existe uma chance de 50% que ele seja hemofílico. Já se tiver uma filha, a chance de que ela também seja portadora é de 50%.
O pai nunca pode passar a doença para seus filhos do sexo masculino, uma vez que o cromossomo X dos filhos homens sempre vem da mãe. Entretanto, ao ter uma filha com uma parceira não portadora, esse pai passa o gene alterado para a menina, tornando-a portadora.
Caso o pai da menina seja hemofílico e a mãe portadora, há a possibilidade da menina herdar dois cromossomos alterados, tornando-se, assim, não apenas portadora, mas também hemofílica.
No caso da hemofilia C, a alteração está no cromossomo 4, um autossomo que não está relacionado com o sexo da pessoa. Por isso, pode ocorrer tanto em homens quanto mulheres.
Acontece quando o sistema imunológico passa a atacar o próprio organismo saudável. Isso pode gerar diversas doenças autoimunes, incluindo a hemofilia adquirida.
Cerca de 1/3 da população hemofílica não possui histórico da doença na família. Sendo assim, acredita-se que o distúrbio seja causado por uma mutação espontânea no cromossomo, que pode ser passada para as próximas gerações.
Os sintomas da hemofilia variam de pessoa para pessoa e de acordo com o grau de gravidade (leve, moderada ou grave) da doença. Em caso de hemofilia leve ou moderada, por exemplo, o sangramento pode não parar após cirurgias ou traumas, sem maiores complicações. Já pessoas que sofrem com hemofilia grave podem experienciar sangramentos espontâneos.
Alguns sintomas mais comuns são:
Atenção!
Os pais ou responsáveis devem ficar atentos, pois crianças podem apresentar irritação inexplicável e se recusar a se mover por conta das dores.
Hematomas localizados na língua, pescoço, antebraço, panturrilhas e no músculo iliopsoas (localizado no quadril) podem levar a problemas graves e, por isso, são considerados hematomas de alto risco. Contate seu médico se houver suspeita de hematoma nessas regiões.
Deve-se lembrar que hemofílicos não sangram com mais intensidade do que pessoas com a coagulação normal, apenas sangram por mais tempo em detrimento da falta do fator coagulante.
Algumas hemorragias decorrentes da condição podem ser fatais e, por isso, é preciso que o enfermo fique atento aos seguintes sinais, que caracterizam situações emergenciais:
Para se ter um diagnóstico preciso, é necessário comunicar ao clínico geral a suspeita de hemofilia, contando o histórico de sangramentos e outros sintomas da doença. Ele pode, então, requisitar um exame de sangue, no qual um enfermeiro coleta um pouco do sangue e envia para um laboratório para análises. No laboratório, um clínico geral ou hematólogo faz a contagem dos fatores coagulantes no sangue e confere se há carência ou não.
Caso a doença seja descoberta após um procedimento cirúrgico ou ortodôntico, o procedimento será o mesmo, e o médico poderá fazer perguntas a respeito de outros sintomas da doença.
Infelizmente, não existe uma cura para a hemofilia atualmente. Entretanto, existem tratamentos que podem ajudar a prevenir e controlar os sangramentos, quando estes ocorrem. Saiba mais:
O tratamento mais comum é a reposição do plasma contendo os fatores coagulantes por meio intravenoso. Em geral, isso é feito com sangue doado ou com um concentrado que não utiliza sangue humano, chamado “fatores de coagulação recombinantes”.
Essa reposição ajuda a prevenir sangramentos espontâneos e estancar feridas abertas. Pessoas com hemofilia grave podem precisar desse recurso com frequência, como medida preventiva, enquanto pessoas com formas mais leves podem precisar apenas após acidentes, cirurgias, entre outros.
O paciente pode receber esse tratamento no hospital ou em casa, pois existe a possibilidade do médico ensiná-lo a preparar e injetar a solução em si mesmo sozinho.
Para hemofílicos do tipo C, o tratamento desse tipo só está disponível na Europa.
Para hemofílicos do tipo A em grau leve ou moderado, a injeção ou spray de desmopressina pode ser uma opção de tratamento. A desmopressina é um hormônio sintético que simula a vasopressina, naturalmente presente no corpo. O papel desse hormônio na coagulação é importante, pois contribui para a liberação do fator VIII, o que, consequentemente, aumenta sua disponibilidade no sangue.
Pode ser administrada através de injeções ou spray nasal. Entretanto, não deve ser usado com frequência, apenas em situações realmente necessárias. Por isso, não é recomendada como medida preventiva para hemofílicos graves.
Os medicamentos antifibrinolíticos ajudam a prevenir que os coágulos se desfaçam. A falta de algumas proteínas nesses coágulos pode torná-los mais frágeis e propensos ao rompimento e, por isso, esse tipo de medicamento pode ser receitado.
Nesses casos, são receitados o ácido aminocapróico e o ácido tranexâmico.
As colas ou selantes de fibrina são uma espécie de cola orgânica que auxiliam na coagulação e cicatrização de certos cortes e lesões. Muito utilizada em cirurgias, essas colas podem ser aplicadas no local do ferimento. Pode ser útil em procedimentos cirúrgicos e odontológicos.
Existem colas de origem animal e colas feitas a partir do plasma humano. Alguns organismos podem rejeitar as colas de origem animal e, nesses casos, é mais indicado o uso de colas humanas.
Quando o hemofílico sofre uma lesão, é indispensável um kit de primeiros socorros. Utilizar gazes para exercer pressão sobre o ferimento ajuda o sangramento a parar. Quando a lesão é subcutânea, como um hematoma, uma compressa com gelo pode ajudar, além de deixar o local dormente e aliviar a dor.
Nunca coloque gelo diretamente sobre a pele, pois a temperatura baixa pode causar queimaduras.
Os sangramentos e hemorragias podem causar danos nos músculos e nas articulações. Por isso, a fisioterapia se faz necessária, para tirar o máximo proveito dos movimentos e tecidos não danificados.
Exercícios físicos também podem ajudar, além de contribuir para maior qualidade de vida. Em geral, os exercícios recomendados para hemofílicos são aqueles com a menor possibilidade de machucar os músculos ou articulações, como caminhadas, natação, entre outros.
Quando as hemorragias internas chegam a causar danos aos músculos e juntas, pode ser necessária intervenção cirúrgica para reconstrução, religamento de tendões, entre outras.
Como a transfusão de sangue para reposição plasmática pode ocasionar a transmissão de doenças, é de extrema importância que o paciente esteja vacinado contra os diversos vírus existentes. Embora o sangue doado seja filtrado, tratado e obedeça a certos critérios, ainda há a possibilidade, mesmo que ínfima, de transmissão de doenças.
Recomenda-se, ao menos, que o paciente esteja vacinado contra Hepatite A e Hepatite B.
Pesquisadores buscam uma maneira de corrigir os genes alterados causadores da hemofilia. Entretanto, a pesquisa ainda não está desenvolvida o suficiente para que esse tipo de terapia seja liberada ao público. Ainda assim, a busca continua e pode ser que no futuro exista uma cura através dos genes.
Por ser uma doença um tanto quanto limitante, os hemofílicos devem tomar alguns cuidados no dia a dia. Confira alguns deles:
Em geral, hemofílicos que fazem tratamento tem grandes possibilidades de conseguir levar uma vida normal. Entretanto, alguns cuidados devem ser tomados. Veja abaixo algumas dicas para a convivência com a doença:
Medicamentos contendo ácido acetilsalicílico e ibuprofeno fazem o sangue ficar mais fino, o que dificulta a coagulação. Nesses casos, os medicamentos normalmente recomendados são os que contém paracetamol.
Há, também, medicamentos que previnem a coagulação. Seu uso é prejudicial para hemofílicos e deve ser evitado. Alguns deles são:
Atenção!
NUNCA se automedique ou interrompa o uso de um medicamento sem antes consultar um médico. Somente ele poderá dizer qual medicamento, dosagem e duração do tratamento é o mais indicado para o seu caso em específico. As informações contidas nesse site têm apenas a intenção de informar, não pretendendo, de forma alguma, substituir as orientações de um especialista ou servir como recomendação para qualquer tipo de tratamento. Siga sempre as instruções da bula e, se os sintomas persistirem, procure orientação médica ou farmacêutica.
Manter uma boa higiene dental ajuda a evitar procedimentos odonto cirúrgicos como, por exemplo, a extração de dentes e, por isso, é de extrema importância para hemofílicos. As consultas ao dentista também devem estar em dia, pois o profissional poderá identificar e acabar com um problema antes que sejam necessárias medidas drásticas, como no caso das cáries.
Caso o paciente queira andar de bicicleta ou praticar outras atividades físicas, é preciso a utilização de proteção como joelheiras, cotoveleiras e capacete. Ao andar de carro, o cinto de segurança é de extrema importância.
Caso haja uma criança hemofílica, o ideal é procurar sempre brinquedos e acessórios macios, para diminuir a possibilidade de acidentes. Pode-se conversar com um terapeuta ocupacional, para ajudar a adaptar a casa e outros ambientes de convivência para a criança.
Não é recomendado que, por conta de sua condição, a criança seja proibida de viver normalmente ou de sair e brincar com as outras. A socialização durante a infância é de extrema importância e não deve ser evitada.
Algumas roupas podem apresentar perigos para o hemofílico, por conta de detalhes metálicos ou zíperes. É recomendável que o paciente prefira roupas com botões ao invés de zíper, assim como sapatos com cadarços no lugar de fivelas. Calças, saias e vestidos muito compridos devem ser evitados, pois a chance de tropeçar nas próprias roupas, cair e se machucar, aumenta.
Ser hemofílico pode ser bem limitante para algumas pessoas e, por isso, elas precisam saber que não estão sozinhas. Os grupos de suporte oferecem informações, terapia e contato com pessoas passando pela mesma situação, o que pode ajudar o paciente, uma vez que o compartilhamento de experiências e problemas pode torná-lo mais próximo de suas capacidades e limites.
Modificações corporais como piercings e tatuagens não são impedidas para pacientes hemofílicos, desde que o médico responsável pelo seu tratamento esteja ciente. Ele pode e deve recomendar que seja tomada uma dose do fator coagulante antes do procedimento estético.
Cabe ao paciente procurar um tatuador profissional que trabalhe em um estabelecimento registrado pela ANVISA, pois estes costumam seguir as recomendações de segurança, como a utilização de materiais esterilizados e descartáveis.
Assim como todas as doenças, a hemofilia pode levar a complicações que podem, em alguns casos, ser graves. Algumas delas são:
A hemofilia é uma condição passada da mãe para o filho e, por isso, sua prevenção é feita durante a pré-concepção.
Quando a mulher sabe que é portadora, ela pode optar por uma fertilização in vitro, que garante que o óvulo utilizado carregue o cromossomo X saudável. Além disso, também pode-se separar os espermatozóides que carregam outro X, para ter uma menina portadora, ao invés de um menino hemofílico.
Apesar de ser uma doença rara, a hemofilia é um dos distúrbios da coagulação mais conhecidos, porém poucos compreendem como ele ocorre ou porquê acontece.
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Referências
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